Incinerador de lixo, aqui não!

A Associação Guarujá Viva (AGUAVIVA), o Instituto MARAMAR para a Gestão Responsável dos Ambientes Costeiros e Marinhos, a Cooperativa de Beneficiamento de Materiais Recicláveis e Educação Ambiental (Cooperben) e o engenheiro e professor da Unisanta Elio Lopes dos Santos alertam às autoridades e a população em geral dos riscos à saúde pública resultantes da implantação, da Unidade de Recuperação de Energia (URE), que segundo preconiza a Diretiva Europeia, não passa de um “incinerador”.

O projeto, que já recebeu a licença prévia da CETESB, encontra-se na fase da licença de instalação e tem sua localização prevista para cerca de 1,2 mil metros da Cava da Pedreira, local onde se pretende armazenar a água para o abastecimento público da população da cidade de Guarujá e Vicente de Carvalho. De acordo com os especialistas, essas duas atividades são irremediavelmente inconciliáveis. Caso isso venha acontecer, emissões de poluentes cancerígenos como fumos de metais pesados, benzo(a)pireno, dioxinas e furanos, entre outros poluentes complexos e tóxicos atingirão o grande espelho d’água do reservatório.

Para o engenheiro e presidente da AGUAVIVA, José Manoel Ferreira Gonçalves, um antigo sonho da população da Baixada Santista pode se tornar um pesadelo de proporções gigantescas. “Doenças respiratórias, pulmonares, alérgicas e dermatológicas ou mesmo enfermidades genéticas, endócrinas, cognitivas e câncer estão entre os reflexos dessa poluição. Imaginem esse material sobrevoando livremente o reservatório destinado a armazenar a água para consumo humano? É preciso tomar uma providência imediatamente”, disse. José Manoel ressalta ainda, que: “É imprescindível que a população consumidora dessas águas, os catadores de resíduos, que fazem um trabalho ambiental central nas cidades e especialmente todo e qualquer cidadão que acredita no valor da compostagem e na diminuição de lixo, se posicionem! É um crime o que se pretende fazer, já há inclusive um licenciamento prévio que precisa ser revogado”, concluiu.

O diretor e fundador do Instituto Maramar, o oceanógrafo Fabrício Gandini, alerta que a questão URE/Cava não foi discutida no Comitê de Bacias Hidrográficas da Baixada Santista (CBH-BS) como era previsto, e um parecer polêmico e questionável foi aprovado há poucas semanas, porém tardio pois veio após a decisão pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente – CONSEMA. “A comissão de análise de empreendimento, a qual faço parte, deveria ter se reunido e criado condicionantes ambientais para o empreendimento antes da deliberação no CONSEMA.  Se o comitê que protege as águas não se posiciona, quem o fará?”.

Gandini ressalta que tanto a Prefeitura do Guarujá, quanto a Conselho de Meio Ambiente COMDEMA, adotaram a mesma postura omissa e acrescenta, “O Maramar, como integrante do CBH BS, repudia o licenciamento desse projeto, que além de não atender o disposto na política nacional de resíduos sólidos que prevê a geração de energia com o uso de tecnologias limpas, se constitui  que além de em crime contra a saúde pública, litiga climaticamente com emissão de monóxido de carbono (CO2) e outros gases poluentes. É desumano e brutal contra outras formas de tratamento de resíduos colocando a natureza como parte da solução. Os catadores de resíduos, verdadeiros agentes ambientais urbanos, são violados gravemente nesse processo pois são os que promovem reuso, reciclagem assim como a população que sabe da importância da compostagem dos orgânicos e redução de embalagens“, finaliza.

Marcelo Silva de Mello, diretor da Cooperben, acrescenta “Esse empreendimento para os catadores, sejam organizados em cooperativas ou não, é muito danoso. Hoje já lidamos com a coleta de lixo que leva para o aterro grande parte do que poderia ser destinado a essas cooperativas. O IPT fez um estudo a pedido da Agência Metropolitana, apontando soluções para viabilizar e melhorar a coleta seletiva, pouco do que foi indicado acontece de fato. Na prática, se os órgãos públicos apoiassem de forma efetiva a coleta seletiva, nós poderíamos fazer muito mais do que os números que nós temos hoje. Geraríamos muito mais trabalho e renda. Sem falar da economia de recursos naturais”, concluiu Marcelo.

Para o engenheiro e professor da UNISANTA Elio Lopes dos Santos a geração de energia pela queima direta da massa (Mass Burning) oferece um elevado potencial de perigo ao meio ambiente, primordialmente à fauna, flora e aos seres humanos, que remete à busca de novas rotas tecnológicas que atendam ao tripé do desenvolvimento sustentável, exigindo o envolvimento de todos os setores da sociedade com o controle social, como preconiza a Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Nesse sentido, buscar soluções, tais como, prevenção e redução da geração de resíduos sólidos, fortalecer os sistemas de coleta seletiva, de logística reversa e a reciclagem, além de adotar práticas como a compostagem e biodigestão anaeróbica, articulando toda a sociedade com eficiência e eficácia, será a melhor resposta contra o desperdício da queima de materiais recicláveis e a poluição gerada por esses processos, considerados como a “Anticultura da Sustentabilidade”.

Água limpa, direito do cidadão e obrigação do estado!