José Manoel Ferreira Gonçalves
Engenheiro, advogado e jornalista
Um Basta no Caos Anunciado
Finalmente, após longos períodos de sofrimento impostos aos usuários do transporte coletivo em Guarujá, a administração municipal tomou uma atitude drástica, porém indispensável. A recente decretação de intervenção na empresa City Transporte Urbano Intermodal LTDA. representa um ponto de inflexão, uma resposta tardia, mas necessária, às inúmeras denúncias, inclusive nossas, e ao clamor popular, ecoado por diversas vozes, incluindo as do coletivo Água Viva, que alertavam insistentemente sobre a precarização do serviço. De fato, os trabalhadores e a população em geral, que dependem diariamente dos ônibus para seus deslocamentos, vinham enfrentando uma rotina de descaso e ineficiência.
O Decreto da Intervenção e a Urgência do Transporte Público Estatizado Já
O Decreto N.º 16.733, publicado em 28 de março de 2025, fundamenta-se em bases legais sólidas, como a Constituição Federal e a Lei de Concessões (Lei n.º 8.987/1995), que preveem a intervenção para assegurar a adequação e continuidade de serviços públicos essenciais. Contudo, a necessidade da medida se torna cristalina ao analisarmos as justificativas apresentadas. A concessionária vinha acumulando falhas graves: desde a dificuldade em fornecer dados essenciais para a fiscalização até problemas sérios de gestão interna. Além disso, a situação escalou com a retirada de câmeras dos validadores, violação de lacres nas catracas, inconsistências nos registros de passageiros e até o desligamento deliberado de aparelhos GPS, inviabilizando o controle da operação e levantando fortes suspeitas de dano ao erário público através de subsídios calculados incorretamente. Diante desse cenário, a intervenção surge como ferramenta para garantir minimamente a operação e, principalmente, auditar as contas e a gestão da empresa.
Por Que a Gestão Privada Falhou Tão Evidentemente?
A experiência em Guarujá, infelizmente, reforça um padrão observado em outras localidades onde a lógica do lucro se sobrepõe ao interesse público no transporte coletivo. A busca incessante por redução de custos, muitas vezes, traduz-se em frota sucateada, menos ônibus circulando, horários inadequados e péssimas condições de trabalho para os motoristas e cobradores. Ademais, as ações da City Transporte, como dificultar o acesso a informações e manipular equipamentos de controle (GPS, catracas), indicam uma falta de transparência inaceitável em um serviço essencial custeado, em parte, por dinheiro público via subsídios. Portanto, fica evidente que o modelo de concessão, neste caso, falhou em garantir um serviço digno e eficiente para a população.
Transporte Público Estatizado Já: Direito Essencial, Não Mercadoria
A intervenção, embora crucial neste momento, deve ser vista como um passo intermediário, não a solução definitiva. É fundamental avançar na discussão e implementação do Transporte Público Estatizado Já. O transporte coletivo não pode ser tratado como uma mera mercadoria, uma “fábrica de milionários” às custas da exploração dos trabalhadores mais pobres, como bem colocamos em nossas manifestações anteriores. Trata-se de um direito social básico, garantidor do acesso à cidade, ao trabalho, à educação e ao lazer. A gestão pública direta, focada na qualidade e na universalização do acesso, é o caminho para romper com a lógica puramente mercantilista. Assim, a estatização, combinada com a implementação progressiva da Tarifa Zero, não só é possível – como demonstramos com estudos e exemplos concretos –, mas também desejável para construir uma cidade mais justa e inclusiva. O Transporte Público Estatizado Já é a bandeira que devemos levantar.
Um Futuro Possível para Guarujá
A intervenção na City Transporte abre uma janela de oportunidade única para repensar fundamentalmente o modelo de mobilidade urbana em Guarujá. É o momento de auditar rigorosamente o passado, garantir a continuidade do serviço no presente e, sobretudo, planejar um futuro em que o transporte público seja, de fato, público, eficiente e acessível a todos. Consequentemente, a gestão municipal tem a responsabilidade de conduzir esse processo com transparência e coragem, ouvindo a população e os trabalhadores do setor. Em suma, o caminho para um transporte digno passa pela retomada do controle público sobre este serviço essencial. A estatização não é uma utopia, mas uma necessidade urgente para garantir o direito à cidade para todos os guarujaenses.
José Manoel Ferreira Gonçalves – Presidente da ONG Frente Nacional Pela Volta das Ferrovias (FerroFrente), entidade que há mais de 10 anos defende a ampliação da malha ferroviária para o transporte de cargas e os trens de passageiros no Brasil. Pós Doutorado em Transportes e Meio Ambiente (Universidade de Lisboa), doutorado em Engenharia de Produção e Mestrado em Engenharia Mecânica, entre outros títulos. É autor de várias obras sobre o setor ferroviário, como Histórias das Ferrovias do Brasil: Ferrovias Paulistas (2018), Despoluindo Sobre Trilhos: Transformação Modal no Transporte de Cargas (2013) e Madeira-Mamoré: História das Ferrovias do Brasil (2017).
Declaração de Fontes:
As informações contidas neste artigo foram obtidas a partir de fontes confiáveis e verificadas, incluindo o Decreto Municipal N.º 16.733 da Prefeitura de Guarujá, análises de especialistas em mobilidade urbana e legislação federal pertinente a concessões de serviço público.
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